terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Um pouquinho de comida para um miserável

A casa dele ficava num prédio escondido nos fundos de um restaurante vegetariano chiquérrimo da rua 19 de Fevereiro, a mesma de uma sauna que eu frequentava com certa regularidade na época em que morava com meus pais. Segurei a vontade de comentar sobre isso, afinal, não é o tipo de informação que se difunda sobre si mesmo, assim como os encontros de internet. Afinal, parece um submundo de orgia e promiscuidade. E é, enfim.

Sou sempre muito atento a imóveis, em especial aos que se localizam na Zona Sul, e aquele parecia um achado: quarto e sala de cobertura num edifício de 4 pavimentos com somente um apartamento por andar. a sala não tinha sofá: somente uns dois fouttons negros, um revisteiro com fotografias de paisagens da cidade aparentemente tiradas por ele e edições de moda, uma mesa de vidro de escritório, um breu vermelho. Tudo isso sobre um piso laminado imitando madeira clara. Ele acendeu a luz, que era amarela. Lembro disso porque em seguida disse:

"Não gosto daquelas luzes econômicos. Tudo fica feio com elas."

E até hoje, quando entro em algum ambiente cuja claridade seja fluorescente, concordo: ele sempre foi bom em criar uma bela apresentação. E a beleza sempre me impressionou e me atraiu. Talvez porque eu achasse que não a tinha comigo numa menos-valia doida. Isso sempre me impediu de ver além, de observar mais a fundo. Logo eu, que justamente me especializei em ver além do que se está escrito, caí na armadilha das aparências.

Mas por que me justifico?

Por que preciso entender. Para alguma serviu esse encontro e essa história. Outro dia, pensei que a vaga dele estava aberta. Seria preenchida por qualquer um que atendesse aos requisitos necessários, assim como uma escola não funciona sem professores, um consultório sem médicos ou uma loja sem vendedores. Eu não funcionava sem alguém como ele. E houve outros.

Em algum momento, colocou algum disco (de vinil) super diferente. Não sei se da Nina Simone, da Marina (anos 80) ou do Lobão (também anos 80). Acendeu um e fumamos juntos. De repente nos beijávamos e transávamos.

Quando acabou, entrei no piloto-automático dos encontros de sexo pela internet: pedi licença para tomar um banho, vesti-me e bati um leve papo superficial antes de ir embora, quando ele me disse:

"Uma amiga está vendo aqui, acabou de ligar. Não vá ainda."

A moça chegou, acho que levava alguma encomenda de baseado para ele. A gente começou a conversar. Ela era amiga em comum do seu ex. Eles falavam disso, de um tempo juntos, da casa de Cabo Frio que ela deixaria pra trás e que lhe trazia memórias:

"Era muito legal quando a galera toda se reunia lá."

Confesso que estava olhando para os dois, meio por fora do papo e pensando num jeito de sair dali sem ser mal educado, apesar de achar que eles é que eram, já que conversavam sobre um assunto do qual não poderia participar. Foi quando ele colocou as pernas sobre as minhas na frente dela.

Não entendi o motivo daquilo, mas acho que foi aí que tudo começou. Um gesto tolo desses para uma pessoa carente como eu era (ou ainda sou) poderia significar tanta coisa... Ele poderia simplesmente querer que ela visse que o fim do namoro estava superado; ele podia simplesmente estar procurando algum lugar para descansar as pernas e as minhas pareciam a solução; ele poderia querer tanta coisa, além do que entendi naquele momento com minha desvalia:

"Ele fez carinho em mim na frente de outra pessoa!"

E foi então que, hoje entendo, naquele momento me dei conta daquela fome que sentia e que nem sabia direito que estava ali:

Uma fome desesperada de amor e carinho.

Nenhum comentário: