sexta-feira, 22 de junho de 2012

Outro dia li um conto da Clarice chamado Miopia progressiva que ficou e ficou na cabeça. Falava de um garoto que percebeu que o que ele era "dependia da instabilidade dos outros". Algo assim: se ele dissesse algo que despertava a surpresa e a reação coletiva de que aquilo fora inteligente, logo ele seria inteligente, por meio da aprovação dos outros (a família). Até que ele recebe a notícia de que passaria o dia inteiro na casa de uma prima que nunca tivera filhos. A partir daí, começa a pensar se consegue planejar o que ele será para a prima que, pela falta de filhos, obviamente o amará. Se disser algo inteligente, será inteligente; se ficar quieto, será calado; se se esconder no banheiro, será aquele-que-não-sai-do-banheiro e por aí vai.

Eu cresci com a impressão de que eu era uma decepção para a minha família. Para meus pais, mais precisamente. Era, segundo eles, delicado, muito educado, observador... Por meio de todos os adjetivos, havia uma certa crítica, afinal, não atendia às expectativas deles, que sempre falavam dos homens que admiravam ressaltando qualidades como bravo, voz grossa, forte. Tudo o que eu não era. Bom, pelo menos eles me diziam que eu não era.

Então acreditei. Acho que é o que todos fazem.

Quanto à minha irmã, ela nunca teve jeito. Tem gente que vem com má índole desde sempre. Muito mentirosa e egoísta.

Então acreditou. Acho que ela faz isso até hoje.

É claro que a minha mãe morrer de ciúmes dela não lhe fez mal algum. Nem dizer que parou de estudar para que ela nascesse. Nada disso ferra com a cabeça de ninguém.

O foda é que até hoje eles falam assim dela. Quanto a mim, já que fiz de tudo para ser diferente e resolvi estudar, sou muito intransigenteo-sabe-tudo. Eles colocam, quando têm oportunidade de fazer essas críticas (o que é raro), um tom pejorativo.

Eu não tenho saco para gente que não assume responsabilidade para as merdas que faz. Não sou solidário com pessoas que tapam o sol com a peneira quando têm que se ver diante do espelho. Eu entendo que meus pais me amam e tudo o mais, mas não aguento ficar muito perto de tanta inconsciência ou alienação sobre si mesmo.

Não consigo ficar muito perto da minha família.

Se vocês acham que isso é intolerância, o que posso fazer além de ser intolerante?

Nenhum comentário: